São José do Rio Pardo, ,

24/Mai/2025 - 11:59:00

Rio das Mortes e Suas Histórias

Felipe Quessada




O rio das Mortes... Esse rio já rendeu muitas histórias de pescador nesta página. Em sua maioria, eu estive lá, vivenciando sua magnitude: águas mansas, praias e matas ciliares — nada artificial, tudo criado pelo Grande Arquiteto do Universo.

Entre essas histórias, algumas são verdadeiras, outras nem tanto. Aqui vai uma cheia de causos, exageros e aquela pitada clássica de pescador.

Era pra ser um grupo de oito, mas, como quase toda pescaria começa antes mesmo da beira do rio, dois pularam fora logo de cara. Um alegou que a hemorroida estava muito atacada, o outro disse, de última hora, que tinha um batizado do filho do melhor amigo — ninguém acreditou, mas também ninguém quis contrariar. Ficaram seis.

O destino foi o rio das Mortes, localizado no Mato Grosso, a 1.600 quilômetros da nossa cidade. Lá, pra quem conhece, é farto de pirarucu e tucunaré. Permaneceram no local por uma semana inteira, neste mês de maio.

Como de costume, o líder foi o Alam (Moranguinho), juntamente com seu pai, o conhecido Bigodi. Os agregados foram: Mauro Careca, Maurão, Fábio e Evandro.

Dois dias depois, no silêncio que só quem dorme ao relento entende, o inesperado chegou: Daniel (Pipa). Sim, o Daniel! Rasgou estrada como se fugisse de um cobrador— foram 1.600 quilômetros sozinho, só pra não perder o cheiro da lenha, a cantoria e, claro, o peixe.

Chegou com o veículo coberto de poeira vermelha, os olhos fundos de cansaço e aquele sorriso que só os doidos e apaixonados por pescaria carregam.

Ninguém perguntou muito. O pessoal só abriu espaço, entregou uma cerveja e puxou mais uma cadeira.

Naquela tarde, o rio das Mortes se abriu para os pescadores como um velho amigo. Na prainha, entre um arremesso e outro, encontraram uns pescadores de Divinolândia — gente simples, boa de conversa. O entrosamento foi imediato: troca de isca, receita de farofa e até um litro de pinga de presente.


Moranguinho x Tucunaré

Numa tarde, o Moranguinho intimou o Bigodi para uma pescaria de tucunaré. Tão logo apoitaram o barco, a linha esticou, a carretilha cantou e o Moranguinho gritou:

— Tá ferrado! Tá ferrado!

Foi um rebuliço danado: Bigodi tentando segurar uma lata de cerveja em uma das mãos e, com a outra, o cigarrinho de palha, berrando:

— Segura, meu fio! O bicho é grande! É o lendário pirarucu assassino!

Enquanto isso, Moranguinho segurava a vara como se fosse uma corda puxando um caminhão carregado.

Depois de uma hora de luta, suor e palavrão, puxaram o bicho: um peixe tão grande que nem cabia no barco.

Diz o Bigodi que parecia mais um jacaré cruzado com pirarucu, com os olhos vermelhos e tudo. Moranguinho jurou de pé junto que o bicho piscou e sorriu pra ele antes de escapar de volta para o rio das Mortes.

O ponto alto? Um tucunaré bonito, firme, pescado pelo Moranguinho, que teve mais sorte que técnica. Foi direto pra grelha torta mesmo, com sal grosso, limão e uma história por cima. E, enquanto o peixe dourava, o pessoal ria, contava vantagem e esquecia da vida que rodava aqui fora.

E o Daniel? Ah, esse só dizia:

— Se eu tivesse ficado, perdia isso aqui tudo. Até minha hemorroida melhorou!

E ninguém teve coragem de discordar.

Porque, no fim das contas, pescaria boa não se mede pelo tamanho do peixe, mas pela quilometragem da amizade.


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